VETERANOS EM ALTA
Jogadores experientes são a base da seleção de Ancelotti rumo ao Mundial de 2026
8 Jun 2025 - O Globo
RAFAEL OLIVEIRA Enviado especial rafael.oliveira@extra.inf.br
É praticamente uma regra do futebol brasileiro: a cada Copa do Mundo sem título, surgem os pedidos por renovação na seleção. Em 2022, com o fim da era Tite após duas edições, a expectativa era de que ela viesse mais uma vez. Passados três anos do ciclo, o que se vê é o oposto. Os jogadores com ao menos uma participação no currículo formam um grupo numeroso entre os candidatos a estar no torneio em 2026. E há possibilidade de a quantidade de “veteranos” na lista final ser um recorde neste século.
Dos 25 convocados por Carlo Ancelotti para os jogos contra Equador e Paraguai, onze já estiveram em alguma Copa. É um time inteiro. Os mais experientes são Alisson, Danilo, Marquinhos e Casemiro. Todos presentes nas edições do Catar-2022 e da Rússia-2018. E, por coincidência, atletas mais defensivos.
Importante lembrar que muitos jogadores na corrida por uma vaga na próxima Copa (alguns até em condição de favoritos) ficaram fora desta data Fifa — seja por questões físicas ou extracampo. Entre eles, estão nomes como Ederson, Rodrygo, Pedro e Neymar, este o recordista de participações (2014, 2018 e 2022) entre os brasileiros em atividade.
NÃO É FALTA DE TENTATIVA
O recorde de veteranos pela seleção em Copas no século é de dez. Ele foi registrado duas vezes: em 2006 (num plantel de 23) e em 2022 (num grupo de 26).
Nos dois casos, o contexto ajuda a entender o número alto. Na Alemanha, os atletas da edição anterior eram ninguém menos que os participantes da vitoriosa campanha do penta. Já o Catar representou a continuidade do trabalho iniciado no ciclo anterior com Tite.
Um número expressivo de veteranos no grupo da Copa não é necessariamente negativo. Assim como uma taxa de renovação alta não é automaticamente positiva. O histórico recente da competição mostra que uma campanha bem-sucedida não passa só por isso.
Dos 26 argentinos campeões em 2022, apenas sete não eram estreantes numa Copa. Já a França vencedora em 2018 tinha um veterano a menos (de um plantel de 23): seis.
Por outro lado, a Alemanha que se consagrou tetra em 2014 tinha 11 jogadores que já haviam disputado ao menos uma edição do torneio. O que pode ser explicado pelo fato de ser a segunda Copa seguida sob o comando do técnico Joachim Löw.
Dos 32 plantéis da Copa do Catar, o brasileiro foi um dos de idade mais elevada. A média de 27,88 anos foi a quarta maior (atrás apenas das de Irã, México e Tunísia). Mas muito próxima da campeã Argentina (27,77) e da Croácia (27,38), semifinalista e sua algoz na competição.
Seria injusto dizer que não houve busca por renovação no conturbado ciclo do Brasil para 2026. Dos 80 jogadores convocados no período (de Ramon Menezes até Ancelotti), mais da metade (44) eram estreantes.
O técnico italiano acabou de assumir e não tem nenhuma ligação com o que vinha sendo feito até aqui na seleção. Mas, além de já ter trabalhado em clubes com uma série de atletas com Mundiais no currículo (como Vini Jr, Rodrygo, Militão, Richarlison e Casemiro), é conhecido por valorizar a experiência. Ainda assim, em sua primeira partida no comando, ele promoveu a estreia do novato Alexsandro e fez de Estêvão titular pela primeira vez.
—O Casemiro está aqui pelas suas qualidades: experiência, conhecimento, liderança. O Estêvão não está porque tem 17 anos. Está pela qualidade. Logicamente, a conexão com jovens traz entusiasmo, motivação e vontade. Experiência traz conhecimento, leitura das situações, liderança. Em um time, tudo isso tem que se juntar — dissertou o técnico ao anunciar sua primeira lista.
— O Estêvão pode ajudar o Casemiro com o seu entusiasmo. O Casemiro pode ajudar o Estêvão na atitude, no compromisso. Sempre é uma questão de conexão —completou.
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RAFAEL RIBEIRO/CBFAlisson. Goleiro elogiou
a melhora do sistema defensivo da seleção
Alisson: ‘o ideal é conquistar essa classificação jogando bem’
Goleiro pede pés no chão e reconhece que momento da equipe é de recuperação
Contra o Paraguai, na próxima terça-feira, em São Paulo, o Brasil terá pela primeira vez nestas Eliminatórias a possibilidade de sair de campo classificado para a Copa de 2026. Para isso, precisa vencer — e a Venezuela, sétima colocada, perder para o Uruguai. Apesar da importância de garantir logo a vaga, o clima não é de euforia na seleção.
É que a possível classificação com duas rodadas de antecedência se deve muito à ampliação de vagas para o próximo Mundial. Como a Eliminatória sul-americana passou a levar seis seleções para o torneio, os impactos da crise vivida pelo Brasil na campanha foram minimizados. Mas os jogadores parecem ter consciência disso.
— Eu acho que depende também da maneira de como se classifica. O ideal é que a gente possa conquistar essa classificação com mérito, jogando bem. Acho que isso também é o que mais vai trazer tranquilidade para nós, tanto para o ambiente interno quanto para quem cobra —afirmou Alisson, ontem.
TREINO NO CT DO CORINTHIANS
O goleiro descartou a possibilidade de relaxar após a confirmação da vaga, venha ela na próxima terça ou na data Fifa de setembro. Para ele, o jogo contra o Paraguai precisa ser encarado mais do ponto de vista de performance do que de classificação.
— Sabemos que vamos encontrar um grande adversário, que evoluiu muito no último ano. Tem o cenário ideal, mas tem aquilo que é a realidade. Então, o primeiro objetivo é classificar para a Copa, sim. Mas para a gente também importa o como. Jogar bem não significa que a gente quer chegar lá e dar show. Significa que a gente quer ter um jogo objetivo, que todos os jogadores tenham o seu desempenho ao máximo. Tanto tática quanto técnica e fisicamente.
Na autocrítica do goleiro também há espaço para elogios. E Alisson viu de perto, contra o Equador, a melhora do sistemadefensivo.Osetortem sido um dos pontos fracos da seleção na campanha atual:
—Ele(Ancelotti)trouxepara a primeira partida um foco de ter um sistema defensivo sólido, que eu acredito ser uma base para toda boa equipe. Então, os jogadores (do sistema defensivo) que ele escolheu para atuar nesse jogo desempenharam muito bem esse papel.
A seleção fez ontem à tarde, no CT do Corinthians, mais um treino para o jogo contra o Paraguai. Na terça, Ancelotti contará com a volta de Raphinha, que cumpriu suspensão na última rodada. Ainda não se sabe se ele irá sacar Richarlison ou Estêvão para promover sua entrada. (Rafael Oliveira)
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O mito do eterno retorno
O pessimismo que cerca a seleção brasileira na estreia de Ancelotti é cíclico como o futebol
MARCELO BARRETO - esporteglb@oglobo.com.br
Acada quatro anos, chegamos a uma conclusão: o Brasil não produz mais jogadores de alto nível. Basta acabar uma Copa do Mundo sem a conquista do título —o que, infelizmente, vem se repetindo com assustadora frequência —que a certeza bate. Era exatamente isso que vocês da imprensa diziam depois de um 0 a 0 com o Equador, em Guayaquil... em 1993! Quem se lembrou disso foi o colega e amigo Paulo Vinicius Coelho, na Rádio CBN. O PVC citou manchetes da época e resolvi pesquisar a do GLOBO naquele dia 19 de julho. “Brasil lucra com empate”, dizia o Caderno de Esportes, de cuja equipe eu fazia parte.
O ataque, naqueles tempos de 4-4-2, era formado por Bebeto (“Muita correria e um gol perdido. Só”, segundo o texto das atuações) e Careca (“Um pouco mais efetivo”). Logo depois, veio a derrota por 2 a 0 para a Bolívia, a primeira da seleção na história das Eliminatórias. E pronto, o fim estava decretado.
Poderia dizer que o resto é história, mas prefiro ser mais específico: nas três Copas seguintes, o Brasil disputou as três finais e ganhou duas, com jogadores como Romário, Rivaldo, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e Kaká — todos vencedores da Bola de Ouro da Fifa. Em 2006, com os quatro últimos no time e um favoritismo gigante, começou uma seca de títulos que dura até hoje. Nesse período, Vini Jr foi o único brasileiro eleito o melhor do mundo, o que só aconteceu no ano passado.
Depois de mais esse período de fracassos, chegamos a outra conclusão que está sempre ali, pronta para ser lançada: o brasileiro não liga mais para a seleção. Trata-se de uma convicção frequentemente atropelada pelos fatos. O ibope do jogo contra o Equador foi o maior do ano na TV Globo, e a fila de espera de ingressos para Brasil x Paraguai, na Neo Química Arena, já passa de cem mil pessoas, mais do que o dobro da capacidade do estádio. Claro que são números inflados pela estreia de Carlo Ancelotti, um dos maiores treinadores do mundo e o primeiro estrangeiro a dirigir a seleção brasileira na era moderna do futebol. Mas a distância entre não ligar e bater recordes é grande demais para botar na conta de uma pessoa só.
Sob o calor de Guayaquil e sobre a grama ruim do Estádio Monumental, a expectativa se transformou em tédio —os dois estados entre os quais se equilibra a mente humana, segundo Mihaly Csikszentmihaly, autor de “Flow”, um livro que poderia muito bem ter sido escrito sobre como gostaríamos que a seleção jogasse: num fluxo contínuo de talento e habilidade, sem que pareça preciso pensar sobre o que se está fazendo. Algo que se costuma atingir com dez mil horas de prática, e não em dois treinos.
E aqui chegamos à terceira frase feita: o que Espanha e França fizeram horas antes, num 5 a 4 emocionante, parecia outro esporte. Mas é o mesmo esporte praticado pela seleção espanhola de 2022, que, sob o comando de Luis Enrique, atualmente celebrado como campeão da Champions pelo PSG, perdeu do Japão e foi eliminada pelo Marrocos? Ou será que tudo é futebol, um esporte que tem seus ciclos e cujos praticantes costumam responder às condições de trabalho que lhes são oferecidas? Procurar as repostas me parece bem mais útil do que vir com elas prontas.
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